domingo, 25 de novembro de 2012

Três tipos de transferência na aprendizagem de português por falantes de español

Conteúdos: investigação em aquisição de segundas línguas (ASL), português para falantes de espanhol (PFE), transferência, interferência.

Conceitos básicos do modelo de construção ligada (MCL):  Os três tipos de transferência em Alonso Rey (2012)

A interferência, entendida como a influência negativa do espanhol na aprendizagem e uso do português, é, sem dúvida, um dos assuntos centrais do PFE tanto nos estudos que tratam da aquisição/aprendizagem da L2 como nos estudos que tratam do ensino da língua a este tipo de falantes.
No MCL é feita uma revisão do fenómeno que está por trás dessa influência e uma das conclusões é que não se pode falar de um único mecanismo de interferência.
"La influencia de la L1 presenta al menos tres formas de intervención en el aprendizaje y uso de la L2, como aprovechamiento o TRANS, como interferencia y como apropiación". (Alonso Rey, 2012, p. 360)
Estes três tipos de influência da L1 correspondem a diferentes pontos do processamento dos dados e obedecem a formas diferentes de tratamento dos dados linguísticos.

A transferência

A transferência é um mecanismo de aprendizagem, uma das formas de construção do conhecimento da IL que utiliza o sistema linguístico para armazenar os dados da L2. Este mecanismo está ligado ao processamento para a compreensão, nomeadamente, é um resultado desse tipo de processamento.
"La influencia de la L1 se puede producir como aprovechamiento del conocimiento existente (o TRANS) por el que se utilizan materiales o patrones linguísticos L1 preexistentes para comprender y, a partir de los cuales, aprender la L2, esto es, contruir la IL". (Alonso Rey, 2012, p. 360)
Esta classe de influência da L1 encontra-se, por exemplo, na codificação lexical como mecanismo que causa erros tanto no plano formal (no significante das unidades) como no plano do conteúdo (no significado) mas con tratamentos diferentes dos dados.

No plano semântico, a transferência consiste na utilização dos significados existentes no mapa concetual de L1 para estabelecer as associações de forma e conteúdo.
Exemplo: *fico [com os meus amigos] em lugar de "combino "
A unidade "ficar" é interpretada como equivalente do espanhol "quedar" e fica ligada com todos os significados que esta palavra tem em espanhol.

No plano formal, consiste em interpretar e armazenar (erradamente) formas da L2 com traços da L1, por outras palavras, o processador interpretou uma forma L2 como um padrão semelhante a um significante da L1.
Exemplo: erro sistemático *almorçar em lugar de "almoçar"
O processador não "percebeu" que esse elemento não tem o "r" em português e guardou incorretamente a forma.

A apropiação

A apropiação é um fenómeno de influência da L1 na produção de L2 em que o processador reage à falta de um elemento L2.
"La influencia L1 se puede manifestar también en casos en que no ha habido input del elemento L2. Falta un elemento L2 necesario para el procesamiento para la producción y el sistema recurre a la L1". (Alonso Rey, 2012, p. 361)
Este mecanismo tenta resolver uma lacuna no conhecimento da L2, implica um desconhecimento da unidade em causa, que não faz parte dos conhecimentos L2 do aprendente. O sistema não tem registada a forma L2 e dá sa uma forma da L1
Este tipo de erros são muito variáveis de aprendente para aprendente e mesmo de turma para turma, já que depende do input que receberam.

A interferência

A interferência é uma terceira forma de influência da L1 que ocorre também na produção mas envolve dados L2. O aprendente recebeu input do elemento L2 mas um padrão L1 interfere na produção. 
"La influencia de L1 se puede producir en el procesamiento para la producción por la competencia de unidades o patrones". (Alonso Rey, 2012, p. 361)
Na produção as diferentes unidades ativadas concorrem entre elas para obter saída, é o mecanismo psicolinguístico que recebe o nome de competição. A interferência ocorre quando o padrão L2 não tem peso suficiente e ganha a forma L1.
"Los patrones de ambas lenguas están activados paralelamente y la selección de uno u otro se resuelve por el peso de la conexión". (Alonso Rey, 2012, p. 285)
A forma mais simples de interferência é a que aparece em erros do tipo *dejar, em que o erro se localiza na forma da palavra. O aprendente conhece a forma "deixar" mas no momento de produzir essa unidade, a forma do espanhol tem mais peso e obtém saída.
O fenómeno por trás deste tipo de erros é diferente dos anteriores: não ocorrem por desconhecimento da forma L2 (apropiação) já que essa forma teve input e foi trabalhada nas aulas; não ocorre por uma má interpretação (transferência), já que o aluno é capaz de corrigir esse erro por si próprio.   

A interferência também pode afetar ao significado de uma palavra (do ponto de vista da L2), por exemplo, nos erros *marchar por "ir", mas o mecanismo é o mesmo: concorrem a forma "marchar" ativada pela L1 com a forma "ir" que seria a utilizada na L2. Não é apropriação porque o aluno recebeu input da forma correta e não é transferência porque não ouve input L2 para marchar.

No próximo post serão revisadas as implicações que o reconhecimento destes três tipos de influência tem no ensino de português para falantes de espanhol.
 

sábado, 17 de novembro de 2012

La transferencia en el aprendizaje de portugués por hispanohablantes

Conteúdos: investigação em aquisição de segundas línguas (ASL), português falantes de español (PFE)

Apresento hoje o meu livro sobre a transferência na aprendizagem de português por falantes de espanhol.



Um dos principais problemas que confrontam tanto professores como investigadores do Português para Falantes de Espanhol (PFE) é o grande número de erros causados pela língua materna destes aprendentes.  A aprendizagem e o uso do português por falantes de espanhol parece sofrer especialmente os efeitos do que se conhece como "transferência", termo geral que diz respeito à influência da L1 na aprendizagem de L2. Neste trabalho é revisado o lugar que este fenómeno ocupa na área de investigação do PFE (cap. 1), em particular, dentro do quadro das "especificidades do processo de ensino/aprendizagem" (cap. 2, 3, 7), um conjunto de caraterísticas próprias que possui este processo em comparação com os falantes doutras línguas. É também revisado o lugar que a transferência ocupa dentro das principais teorias de ASL (cap. 4), desde os inícios deste campo de investigação até à atualidade. A seguir, são apresentados os princípios fundamentais da abordagem conexionista/emergentista de ASL (cap. 5), o quadro teórico em que se desenvolve a proposta de interpretação da transferência desta obra. Para verificar a validade desse quadro teórico, são analisados os dados da produção linguística de aprendentes falantes de espanhol, introduzindo em primeiro lugar o que é entendido por produção da linguagem (cap. 6) e estabelecendo a metodologia de análise de erros (cap. 8). Os dados de análise são os verbos em forma pessoal e são apresentados e explicados os erros que correspondem à codificação lexical (cap. 9), à codificação morfológica (cap. 10) e à codificação fonológico/grafemática (cap. 11).

Entre as aportações desta obra ao PFE  há que salientar:
1) a reformulação e sistematização da teoria das especificidades e a integração da transferência como explicação delas, a partir da lista de especifidades proposta por Almeida Filho (1995) de grande utilidade na formação de professores de PFE;     
2) a proposta de um marco descritivo e explicativo para a aprendizagem e uso do português por falantes de espanhol, o que se pode denominar como modelo de contrução ligada para PFE vinculado à abordagem construtivista ou conexionista/emergentista de ASL;
3) a proposta de análise de erros da produção, consequente com a natureza psicolinguística da aprendizagem e do próprio processode produção, que oferece não apenas uma taxonomia de erros mas uma cartografia do processamento que conduz a esses resultados;  
4) a proposta da existência de três tipos diferentes de "influência de L1" como resultado de três fenómenos diferentes, que atendem a mecanismos de processamento diferenciados e que implicam em consequência modos de tratamento diferentes para esses erros do ponto de vista da ação didática.

Nas próximas entradas do blogue, serão apresentados e discutidos algum dos conceitos básicos deste trabalho.
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...